sexta-feira, 13 de abril de 2012

Qual o meu tamanho, Fernando Pessoa?




Chego eu na farmácia pra comprar meu lindo prozac mensal. O moço, tooodo solícito, traz as caixas e diz: "-A sra. está com ansiedade, é?". Eu, toda, verdadeira e paciente, balanço os olhos, encaro-o na barriga e digo,com o ar mais ameaçador q posso:" -Dentre outras coisas, dentre outras coisas...". Ele, não satisfeito, replica: "-Temos isso aqui também, ó!É ótimo, para stress, depressão, ansiedade, cólica, dificuldade de concentração..." Eu, atônita, o vejo erguer em minha direção uma caixa de vitaminas com nome estrambólico em inglês. Olho-a sem muito prazer e percebo que existe tb uma versão masculina (numseiquelá man) da panaceia q me é descaradamente oferecida. Enquanto engulo a minha vontade de perguntar se ele é louco, por me querer vender algo assim, na maior caradepau, digo, por fim:" -Ok, tá." Ele, por incrível que pareça, não desiste e logo acentua os poderes milagrosos da tal vitamina: "-É muito boa!! Sai muito, viu?". É obvio q fiquei uns segundos meio q estarrecida, meio q indignada, meio q cansada diante daquele entusiasmo todo. Me senti em meio a um comercial das Facas Ginsu :"Não, não desligue a TV!! Na compra dessas maravilhosas facas, você ainda levará, totalmente de graça, este maravilhoso...", etc e tal. E assim é a vida. Saio da farmácia pensando se eu tenho cara de louca. Ou de ingênua. Ou de nada. Cara de paisagem. Será que aquele atendente me tratou como a Indústria Farmacêutica me trata? Com cara de paisagem, que nada faz, diz ou pensa?
Logo comecei a pensar tb no meu corpo, em como eu o trato e em como a sociedade ("em q estou inserida!!" chavão básico das redações de vestibular!risos)o trata. Afinal, pra que servem cabeça, tronco e membros? Aliás, "servem"? De quantas interdições eu já me libertei? Com quantas rasuras me contruí? "No princípio era o Verbo.E o verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus. (...) E o verbo se fez carne e habitou entre nós". (Jo 1, 1-3;14).São com esses verbos, adjetivos, pronomes, numerais, interjeições e todas as outras classes "gramaticais" que traço a minha corporeidade e defino a minha existência nesse mundão grande de meu deus. Ponto. É isso mesmo? Deus presente em mim? É disso que quero falar? Da gratidão em não me reconhecer como uma máquina que atende a todos os comandos, sejam eles imbecis ou enfadonhos ou inúteis? É.É disso.Cê tá ouvindo, seu atendente da farmácia; dona televisão; seu sistema educacional alienante; sua quadrilha de politiqueiros indignos e mais uma porrada de gente que insite em querer tratar o meu corpo como receptáculo de boas intenções, daquelas que o inferno está cheio? Risos. O texto está tomando um tom bem religioso, bem revoltado e bem adolescente. Risos. Sou católica.Tenho inquietações milhões. E..por mais q eu sofra com essa verdade, qdo lidamos com paixões, somos sempre adolescentes(minha amiga Raquel, psicóloga "das boa e percurada" é sábia!!!. Nesse caso, minha paixão do dia é o meu corpo. Fibras e células e(x)tendidas. Qual o meu tamanho, Fernando Pessoa? Xô te dizer: no varal coloquei os meus sonhos, mas num pense vc que eles ficarão lá, largadinhos, não!! Eu quero ter /ser um corpo sadio (mens sana in corpore sano!) e cônscio de todas as divindades que nele habitam. E, principalmente, quero que os meus sonhos não esbarrem em um balcão de farmácia. Quero os meus sonhos no meu corpo e que ele...ah..que ele, Chico Buarque de Holanda, seja testemunha do bem que sonhar me faz. A propósito, feliz dia do beijo pra todo mundo!!


P.S.:Lá no início,Dahmer, o cartunista mais lindo do Brasil. Logo acima,minha fantasia de Eva (e não Betty Boop!!!) nas ruas do lindo Carnaval de Olinda.

16 comentários:

  1. lara, lara... no minimo vc pode exacerbar seus sentimentos e inquietudes em otimas crônicas como esta. E O QUE SERIA DA ARTE SE NÃO FOSSE A INQUIETAÇÃO DA ALMA?
    Obs: Pode chamar de Eva a vontade que a betty boop vai estár lá, pra tomo mundo ver.

    bejos saudosos da prima

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    1. Risos. Pat, eu coloquei até as maçazinhas pra simbolizar a fertilidade de Eva!

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    2. Epa! os créditos das maçanzinhas são meus... eu fiz esse bordado e deu trabalho (rsrsrsrs) e não eram maçãs... eram umas pitangas... acerolas... sei lá... só sei que essa Eva abalou as esruturas das ladeiras de Olinda-PE, tal era sua leveza, beleza e tranquilidade Quase Sã, que conseguiu contagiar até mesmo a minha pessoa, toda arrebentada, angústiada...

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    1. "Larika" é ótimo, hein???risos..confesso q estes foi uns dos txts mais leves p escrever. Eu tb ria muito ao lembrar da atitude patética do vendedor..e, qto à eva, eu estou convicta, sem problemas e/ou pudores!! p^! até maçã eu tinha!!risos. daniela, na sinceridade, saudades de vc.

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  3. Larika, nem sei se era pra fazer isso, mas eu ri desde as primeiras linhas do teu texto! Essa atitude do balconista se compara aos vendedores de garrafadas falsificadas e etc e tal... Estamos na era de venda dos milagres milagrosos... e a regra diz: " sai muito. Todo mundo compra"

    PS: ficou foi impactante esse traje de Eva! Sobre a Betty Boop, relaxe... eu estava de Frida e um mancebo pegou no meu queixo e cantou: "oh jardineira por que estais tao triste? Mas o que foi que te aconteceu?..." Sejamos o que somos sendo!
    Bjs

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  4. O cara só queria o seu bem. Quero ver no dia que vossa mercê se atrasar e a farmácia já estiver fechada se vai falar mal do farmacêutico. Fluoxetina não vende no galo vermelho. Texto massa, amiga. Abração

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    1. risos! "num vende no galo vermelho" é ótimo.rsrrs

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    2. Sim, provavelmente ele só queria 'o bem'. O problema é o fato dos chamados 'serviços-de-bem', ofertados pela ciência+capitalismo acreditarem saber - e ditarem - o que é o bem do sujeito... (muito frequentemente, nos dias de hoje, convertido em caixinhas de pílulas).

      Nem sempre quem diz, sabe o que diz, e o balconista parece ser apenas mais um a reproduzir o discurso dominante.

      Carolina Biondi

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    3. concordoem gênero, númeor e grau, carol!!!

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  5. esse seu 'Deus presente em mim... é disso que quero falar' e esse seu 'Verbo' me remeteram a esse poema. Divido.

    A FILHA DA ANTIGA LEI - Adélia Prado

    Deus não me dá sossego.
    É meu aguilhão.
    Morde meu calcanhar como serpente,
    faz-se verbo, carne, caco de vidro,
    pedra contra a qual sangra a minha cabeça.
    Eu não tenho descanso neste amor.
    Eu não posso dormir sob a luz do Seu olho que me fixa.

    Quero de novo o ventre de minha mãe,
    sua mão espalmada contra o umbigo estufado, me escondendo de Deus.

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  6. Brisa...q coisa linda esse poema...um presente tão sensível qto vc...obrigada muito!!!!

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  7. Lariii, está demais viu?rs Suas aulas, seus pensamentos e suas ações, sempre nos tras grandes ensinamentos! Saudadees ;)

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